Ao Bernardo Ribeiro Costa
11/09/1970 – 21/2/2012
Os dias acabaram
ainda a Primavera se aproximava
tímida mas já as suas flores negras
ameaçavam a matéria tão frágil de que somos feitos
terminava assim o sofrimento debaixo das altas copas do tempo
onde tudo é menos frio que o frio de estar vivo
quanto pesa a dor dos dias sem cor?
uma infinita milésima de grama
capaz de sufocar
e para que servem todas essas flores
que assinalam a negação de tudo o que pudesse ser?
a boca sedenta de esquecimento
aniquila todas as dimensões das coisas
para que o que exista caia
se parta se veja
se evapore
e depois desapareça para sempre
e porquê ?
e para quê estar aqui?
esperando um acidente que viesse misericordioso libertar a carne da sombra
mas ele não veio
e tudo ficou nas mãos dormentes do homem
afundado na penumbra da ultima madrugada
e se a morte não fosse um veneno que pudesse gritar teu nome
e se ela não fosse tão magnética
e se ela não te telefonasse dizendo que te amava
se não te beijasse completamente nessa noite extrema
o que sobraria de ti
horror do mistério
ultimo estertor
até que a vida se partisse contra o céu num soberbo mergulho
o corpo laminado pela angústia
o corpo sem pele….
o corpo rasgado pela noite….
ó mãe ajuda o teu filho
não o deixes adormecer
não deixes que o seu sangue acabe antes do teu sangue
ó mãe não deixes porque a tua dor será infinitamente maior
e servirá apenas
para adoçar a fétida pestilência da morte
que dá á terra este rosto com os olhos abertos para dentro
desce com ele o sonho já sem nenhuma ansiedade
nessas mãos ausentes que acolhem
a treva que passa e liberta da sepultura
de um corpo morto a alma pura.